domingo, 27 de março de 2022

... até o pano descer ...

 




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quarta-feira, 23 de março de 2022

... gostava de te convidar para minha casa ...

 



Gostava de te convidar para minha casa,

como aos amigos nos velhos tempos.

Abria uma garrafa de vinho e contava-te de quando era pequeno

e tu contavas-me como te corre o emprego, o amor.

Vemo-nos todos os dias e falamos tão pouco.

Estendo-te a mão e às vezes dás-me uma moeda,

mas falamos tão pouco.

Gostava de te convidar para minha casa

mas não tenho casa, vai ter de ficar para a próxima.

 

Filipa Leal, “Nocturno para Varsóvia” in Vem à Quinta-feira



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segunda-feira, 21 de março de 2022

... porque ainda há dias de poesia ...


Magoa-me a saudade

do sobressalto dos corpos

ferindo-se de ternura

dói-me a distante lembrança

do teu vestido

caindo aos nossos pés

 

Magoa-me a saudade

do tempo em que te habitava

como o sal ocupa o mar

como a luz recolhendo-se

nas pupilas desatentas

 

Seja eu de novo tua sombra, teu desejo

tua noite sem remédio

tua virtude, tua carência

eu

que longe de ti sou fraco

eu

que já fui água, seiva vegetal

sou agora gota trémula, raiz exposta

 

Traz

de novo, meu amor,

a transparência da água

dá ocupação à minha ternura vadia

mergulha os teus dedos

no feitiço do meu peito

e espanta na gruta funda de mim

os animais que atormentam o meu sono

  

… poema “saudade”, de Mia Couto…




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sábado, 19 de março de 2022

... then love becomes our legacy ...

 














(…)

We will not be turned around

or interrupted by intimidation,

because we know our inaction and inertia

will be the inheritance of the next generation.

Our blunders become their burdens.

But one thing is certain,

If we merge mercy with might,

and might with right,

then love becomes our legacy,

and change our children's birthright.

(…)

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(…)

Não seremos demovidos

Nem interrompidos pela intimidação

Porque sabemos que nossa inação e inércia

Serão herança da próxima geração

Os nossos erros tornam-se seus fardos.

Mas uma coisa é certa:

Se fundirmos compaixão com o poder, e o poder com o direito,

Então, o amor será o nosso legado

E a mudança, o direito inato das nossas crianças.

(…)

  

Amanda Gorman, “The Hill We Climb”/“A Colina Que Subimos”





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quinta-feira, 17 de março de 2022

... guerra ... ainda ...

 


São meus filhos. Gerei-os no meu ventre.

Via-os chegar, às tardes, comovidos,

nupciais e trementes

do enlace da Vida com os sentidos.

 

Estiveram no meu colo, sonolentos.

Contei-lhes muitas lendas e poemas.

Às vezes, perguntavam por algemas.

Respondia-lhes: mar, astros e ventos.

 

Alguns, os mais ousados, os mais loucos,

desejavam a luta, o caos, a guerra.

Outros sonhavam e acordavam roucos

de gritar contra os muros que há na Terra.

 

São meus filhos. Gerei-os no meu ventre.

Nove meses de esperança, lua a lua.

 

Grandes barcos os levam, lentamente...

 

... poema "Guerra", de Natércia Freire, in "Liberta em Pedra"


domingo, 6 de março de 2022

... guerra ...

 



E tropeçavam todos nalgum vulto,

quantos iam, febris, para morrer:

era o passado, o seu passado — um vulto

de esfinge ou de mulher.

 

Caíam como heróis os que não o eram,

pesados de infortúnio e solidão.

(Arma secreta em cada coração:

a tortura de tudo o que perderam.)

 

Inimigos não tinham a não ser

aquela nostalgia que era deles.

Mas lutavam!, sonâmbulos, imbeles,

só na esp'rança de ver, de ver e ter

de novo aquele vulto

— imponderável e oculto —

de esfinge, ou de mulher.

 

David Mourão-Ferreira, in "Tempestade de Verão"




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quarta-feira, 2 de março de 2022

... You don't take a photograph, you make it....

 



Não fazemos uma foto apenas com uma câmera.
No ato de fotografar juntamos todos os livros que lemos,
os filmes que vimos, a música que ouvimos,
as pessoas que amamos.

(Ansel Adams)







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