segunda-feira, 25 de abril de 2022

... a cor da liberdade ...

 


Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Quase, quase cinquenta anos

reinaram neste país,

e conta de tantos danos,

de tantos crimes e enganos,

chegava até à raiz.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Tantos morreram sem ver

o dia do despertar!

Tantos sem poder saber

com que letras escrever,

com que palavras gritar!

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Essa paz de cemitério

toda prisão ou censura.

e o poder feito galdério,

sem limite e sem cautério,

todo embófia e sinecura.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Esses ricos sem vergonha,

esses pobres sem futuro,

essa emigração medonha,

e a tristeza uma peçonha

envenenando o ar puro.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Essas guerra de além-mar

gastando as armas e a gente,

esse morrer e matar

sem sinal de se acabar

por política demente.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Esse perder-se no mundo

o nome de Portugal,

essa amargura sem fundo,

só miséria sem segundo,

só desespero fatal.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Quase, quase cinquenta anos

durou esta eternidade,

numa sombra de gusanos

e em negócios de ciganos,

entre mentira e maldade.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

Saem tanques para a rua,

sai o povo logo atrás:

estala enfim, altiva e nua,

com força que não recua,

a verdade mais veraz.

 

Qual a cor da liberdade?

É verde, verde e vermelha.

 

JORGE DE SENA, 1979, in “40 Anos de Servidão”

Cantiga de Abril - Às Forças Armadas e ao povo de Portugal

«Não hei-de morrer sem saber qual a cor da liberdade» 










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