sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

Morrer é assim rubro – ou incolor?

 

Janeiro entardece cedo, embrulhado

Em silêncios que preparam o cenário

Para a invenção da cor vermelha.

É como se tivessem derramado a oeste

Nas nuvens desgarradas do ocaso,

Uma tinta escarlate

E o escarlate alastrasse e sumisse o sol.

 

Ou como se alguém com negligência

Tivesse esfolado um animal

Nos incertos territórios do poente

Deixando o céu salpicado de sangue.

Seja por que razão for, o pôr-do-sol

Hoje está rubro, como os poetas gostam.

 

Mas andam no ar presságios e ameaças:

Qualquer coisa pode estar a caminho do fim

Ou de um recomeço entre tumultos.

 

Com a frieza própria das metáforas,

Resta a dúvida de sempre

Ao fim deste dia de Janeiro

Que acaba amortalhado em cores sangrentas:

 

Morrer é assim rubro – ou incolor?




Poema: “Quarteto de Janeiro”, parte 4, de A. M. Pires Cabral, in “Caderneta de Lembranças” 




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