domingo, 9 de janeiro de 2022

A recusa do amor

 



Não temos uma arma apontada à cabeça,

dizias-me. Mas era impossível que não visses,

impossível. Eu ao teu lado com aquela dor

no pescoço, imóvel, cuidadosa, o cano frio

na minha testa, a vida a estoirar-me

a qualquer momento. Era impossível que não visses

o revólver que levava sempre comigo. Por isso dormia

virada para o outro lado, não era por me dar mais jeito

aquele lado, era por me dar mais jeito

não morrer quando nos víamos,

era para dormir contigo só mais esta vez,

sempre só mais esta vez,

sempre com o meu amor a virar-se de costas,

sempre com o teu amor apontado à cabeça.


                                                                     “A recusa do amor” de Filipa Leal




______________________________________


Sem comentários: